terça-feira, 30 de novembro de 2010

PERGUNTA SEM RESPOSTA


O Diário de Notícias de 25-XI-2010, em azo de comemoração, lembrou-se de ocupar as duas páginas centrais do jornal com o 25 de Novembro, que virou a linha política que se reviu no 25 de Abril. Para isso, em grande destaque, aventa com uma interrogação que põe em dúvida e justifica a charada:

25 de Novembro
E se tivesse sido ao contrário?

Não sendo uma resposta, mas sim um comentário, pressupõe-se que só o profeta ou animal político seria capaz de responder, e mesmo assim com todos os riscos de acertar. Não sendo assim só poderá afirmar-se sem ofensa, mas com piedade, o que todo o bicho-careta pode garantir sem que alguém possa contestar e que é: Resposta - Uma coisa é certa: seguramente não se pode prever pior em todos os sentidos.
O profeta pelos vistos errou magistralmente. Agora sou eu que pergunta: Quem paga o palpite do profeta? Segundo as leis de imprensa a resposta deveria ser publicada nos mesmos modos que a pergunta que, aliás, não tem pés nem cabeça, sabendo-se e sentindo-se que já estamos todos a bater no fundo. O que quer o jornalista que se responda? Ou está a gozar com o pagode? A não ser que se trate de um exemplo de jornalismo humanista.


Fernando Vieira de Sá

domingo, 21 de novembro de 2010

A CIÊNCIA DO DIAGNÓSTICO - A CRISE - A PREVISÃO DO PREVISTO

(clicar na imagem)

Há uns tempos, concretamente dia 13 de Outubro passado, o Diário de Notícias publicava com relevante destaque a notícia da morte de Maurice Allais (1911-2010), cujo cabeçalho ressuma e convida à veneração. Desta notícia releva-se a justificação do Prémio Nobel da Economia (1988) como sendo um dos poucos a prever o crasch (bancarrota) em Wall Street, em 1987.
Não vou discutir o galardão nem as homenagens, mas sim a discordância e a tentativa de querer-se dissociar o fenómeno «crise» do sistema económico em vigor, como se fosse qualquer crise inesperada e pouco ou nada estudada, E com isso escamotear e ignorar antecedentes indesmentíveis, ou fazer-de-conta, macaqueando a história do mundo. Chama-se a isto falta de ética e de pudor.
Com esta canhestra manipulação informativa, duas ocorrências saem da História como artes de saltimbanco, limpando-a de incomodativas ideias, face à tendência oposta tais como: - a ambição do ideal social sempre no sentido da justiça e bem-estar susceptíveis de beneficiar a sociedade, dentro das regras da fraternidade e justiça; - a circunstância do fenómeno «crise» estar profundamente investigado desde Karl Marx (1898) que, pela primeira vez, responsabiliza o sistema capitalista de estar de costas voltadas para a contradição: «A produção é social e a apropriação dos produtos é individual», o que leva a crises que abalaram o Mundo e que estão registadas como abaixo se expõe, permitindo o seu estudo, consequências e outros detalhes de interesse à investigação.

(1) - Fonte: Introdução ao Marxismo, de F. Engels, A. Talheimer, J. Harari e L. Segal, Rio de Janeiro, Editorial Calvino, 1945

Actualmente a tendência continua a registar-se. Nesta conformidade pode conjecturar-se a falência do sistema actual pela excessiva concentração da riqueza, levando à paralisação da troca e defunção do sistema em causa, tal como Marx diagnosticou, investigando cientificamente as causas profundas dos colapsos próprios do regime. Desse facto nasceu o Marxismo, teoria ecuménica de aprofundamento das Ciências Económicas, hoje uma bandeira que as forças tradicionais combatem ferozmente. Marx - não se esqueça - era um investigador nato em ciências económicas, dada a sua preparação académica, sendo economista e doutorado em Filosofia. Marx era, acima de tudo, um investigador social que leva à política e como tal agiu dentro da sua capacidade intelectual e científica. De resto, e querendo não o dizer, mas levado pelo transe discursivo num momento apelativo no encontro de Presidentes da República na TV, Mário Soares, há semanas atrás, afirmou precisamente esse facto, o que espantou todos os telespectadores. Pela minha parte, fiquei atónito, mas do «animal político» espera-se tudo, faz parte da sua flexibilidade estratégica de catavento, timbre do carácter do político em causa. Desta vez deu-lhe o bestunto para a verdade.

Para terminar, e voltando a Maurice Allais, não se percebe assim qual foi a proeza da previsão que o levou ao Prémio. Parece, por vezes, medalhar-se mais o interesse político que se explora, do que a ciência na sua imaculada independência. Não façamos do Nobel uma broa de Natal, como a propósito deste morto repescado como sábio e que neste caso nada descobriu, pois que, como se sabe, tudo já estava descoberto, mas, mesmo assim, «venha-de-lá-um-Nobel!» que é sempre saboroso. Seria mais racional medalhar à data de nascimento já que um morto é sempre um ponto final, enquanto o nascimento é sempre um futuro. Nem tudo lembra nestes transes. E no meio de todas estas efemérides, do problema CRISE nem uma palavra, como se nada tivesse havido, o que tem duas leituras: uma, dar os louros às almas ressuscitadas como neste economista da irmandade certificada; outra, e principalmente, guilhotinar a memória de Marx, cujos estudos levaram ao que veio a designar-se de Marxismo, um novo caminho àquilo que até aí não se pensava haver uma porta alternativa ao sistema capitalista, E quando na Era Moderna existe uma ampla alternativa ao trabalho escravo, sem regalias, hoje amplamente tal força é substituída pela mecanização e energia, tomando o maior esforço da produção. E daí o que se vê: a contradição expressa por Marx e que se repete: «A produção é social e a apropriação dos produtos é individual».

Mas, no nosso caso, nem o sr. Maurício nem os ilustres economistas desta praça, incluindo o bota-abaixo Medina Carreira se atrevem a beliscar a vivência liberal capitalista que só tem produzido borrada atrás de borrada e, não obstante, nunca se discute nem o regime, e muito menos se averiguam as razões das crises. E todos sabem porquê. Está à vista. É assim que democraticamente se ignora o povo. E cá estamos todos para pagar a batota do sistema.
Porque não fazer o diagnóstico, ou seja, procurar a causa profunda como fez Marx? Isto, sem pôr em causa a inexcedível honestidade de quem quer que seja, os seus conhecimentos, a sua ciência, mas não aplicável por pôr em causa o sistema capitalista. E cada vez há mais fome e cada vez há mais desempregados. Seria tempo da aberrante ditadura capitalista deixar a gente honrada viver honestamente, pois a ladroeira até agora só recebeu favores dos economistas distraídos. Basta de ditadura capitalista, a mais desumana das ditaduras como se observa aqui mesmo, e de que maneira. Aqui está uma boa arena para o sr. Medina Carreira exercitar os seus espectáculos televisivos, contra tudo e contra todos. Mas nada, absolutamente nada sobre o diagnóstico das CRISES, nas quais os seus contrapontos também não beliscam por serem da mesma confraria.

PONTOS DE ENCONTRO NA CIÊNCIA DO DIAGNÓSTICO

HIPÓCRATES (460-377 a.C.) está para as Ciências Médicas como MARX (1818-1883) está para o sistema capitalista em jogo.

Ambos, pela primeira vez na História da Humanidade, abriram portas à racionalidade da busca das causas distantes dos distúrbios pela descoberta do diagnóstico, por Hipócrates na Ciência da Medicina, por Karl Marx nas Ciências da Economia.
A utilização do processo diverge: na Medicina, o diagnóstico é prática obrigatória no exercício médico. Não há Medicina sem diagnóstico. E na Economia, quem diagnostica?

A fome espera.
O desemprego desespera.
O medo e a conveniência penalizam a moral e a honra.
E a fome campeia como praga do destino.
Deus dedit, Deus abstulit (2) (Deus m'o deu, Deus m'o tirou). É a Moral. Por exclusão de partes, Marx é o Diabo.

Fernando Vieira de Sá
(2) - Segundo o Dicionário de Moraes, «palavras de Job que se citam como exemplo de resignação».