quarta-feira, 26 de agosto de 2009

AGRADECIMENTO

Longe estava de ser alvo da vaga de felicitações vindas do espaço «Internet», saudando-me pelos meus 95 anos de existência, parecendo querer disputar façanha de paciência e teimosia, como se estivesse maldosamente a dificultar a vida à Caixa de Aposentações, procurando baralhar os cálculos e as percentagens aos responsáveis das contas da sustentabilidade de fundos face à rentabilidade que um montão de tropeços parece querer sabotar.

Segundo a afirmação de um probo sacerdote em homilia versada em missa de núpcias, onde os jovens abundavam acompanhando os nubentes e nós assistíamos por deferência com os pais do noivo, o dito sacerdote evocava aos crentes, e não tanto, acusando, erguendo os braços ao céu: «Essa velhada que por aí anda, que não faz nada e para a qual todos nós pagamos...». Palavras ditas de cima de um púlpito cristão. Abençoadas palavras entre os crentes... O silêncio calou. A intenção, ao que parece, teria sido a de querer ser simpático à jovem assistência presente na mira de arranjar freguesia. Já fora do templo cochichava-se o episódio. Valha a verdade, inédita descaidela.

Podia este crime longevidade (que faz o desespero dos «manga-de-alpaca» e o inconformismo do cura desbocado) passar oculto. Pela minha parte nada fiz de motu proprio para suscitar tal desaforo do clérigo, prejudicando os cálculos dos honestos (por enquanto) responsáveis devotados à nossa Segurança Social, bem como das nossas almas sob custódia do Divino Senhor, como se sabe...

Contrariamente, fiquei sensibilizado com tantas palavras de incentivo à vida vindas de amigos e amigas, por vezes de longe e de fora de Portugal ou pensando eu já ausentes em qualquer memória.

O responsável de tal publicidade e de implícito desacato a instituições à guarda dos impolutos funcionários - nunca é demais sublinhar - guardiões e condutores dos destinos da Pátria, o responsável, repito, foi o meu velho (antigo, quero dizer) amigo Luís Guerra que, dos meus graneis de prosa modesta, produziu como editor - Moinho de Papel - quatro títulos da mais perfeita e cuidada qualidade que a sua competência e amor à arte - e só - ao lapidar a rocha, encastoou a jóia, abrilhantando uma prosa de restritos aliciantes - vida de samaritano, palcos de subdesenvolvimento e fome, guerra, desconforto e luta contra o despotismo, temas que não apelam ao convite da leitura.
Pela minha parte, acho que cumpri o meu dever de cidadão do mundo, denunciando, informando sobre a vida onde ela se processa, longe dos asfaltos e das elites. Quanto aos outros, cada um age segundo os seus critérios e horizontes. Não é só rezar e pedir a Deus. Ao «arregaçar as mangas», os deuses também agradecem quando se serve a causa nobre e não se surripia bens alheios.
Resumindo:
1 - Para Luís Guerra, e aqui incluo a Lurdes, sua mulher, e seus filhos, vai todo o meu reconhecimento pela amizade que me dispensam e ajuda que me têm oferecido tornando-me o fardo mais leve, menos pesado.
2 - A todos os outros amigos e amigas, muito comovidamente agradeço a vossa disponibilidade em terem acedido a esta manifestação de afecto de todos vós, contribuindo com as vossas mensagens para fazer deste dia Um Dia, grande como as vossas palavras, Não pelos 95, mas pela alegria de me recrear sentimentos remotos de amigos e amigas, tão maravilhosos quanto já inesperados num mundo em que só a «cotação da Bolsa» tem a palavra útil. Há excepções. Nem tudo é liberalismo global.
Iniludivelmente, filho, nora, netos e netas e até dois bisnetos, fizeram presença, emprestando calor, amor e vivência ao momento. Só uma ausência senti. Contingências do ciclo da existência que só a mim diz respeito.
Com todo o meu coração,
Fernando Vieira de Sá

terça-feira, 25 de agosto de 2009

AINDA OS 95 ANOS DE VIEIRA DE SÁ - DEPOIMENTO DE JOSÉ VEIGA SIMÃO

Caro Doutor Vieira de Sá,

Meu Caro Amigo

O Vieira de Sá faz 95 anos, hoje dia 20 de Julho de 2009. Tenho imensa pena da inclemência de obrigações que nos comandam a vida, não ter permitido, nos últimos quinze anos, manter consigo os diálogos frontais e criativos em que a dureza saudável de opiniões diversas era alimento natural da adesão ao objectivo último: servir e prestigiar o nosso Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial e, através dele, o Estado português. A amizade com Vieira de Sá transcendia e sublimava convicções políticas. O Presidente do LNETI viu sempre nele o investigador culto, actualizado e competente, um obreiro exemplar de uma instituição ao serviço das empresas familiares e das pequenas e médias empresas, tão desprezadas pela maioria dos governos, para quem os negócios da intermediação são prioritários em relação aos negócios da criação. O resultado para o País é conhecido.

Apesar de tudo, a verdade é que muitas empresas inovadoras na área das indústrias agro-alimentares do norte ao sul do País, do continente às regiões autónomas, beneficiaram das iniciativas e actividades que a “equipa de Vieira de Sá” realizou ao longo de muitos anos, desde os tempos do Instituto Nacional de Investigação Industrial. O saber, o saber fazer e o fazer desses técnicos e investigadores foi absorvido por centenas de empresas e permanecerá como fermento da renovação necessária a uma equilibrada industrialização do País, que novas gerações, alguns, seus discípulos, haverão de protagonizar. Os 95 anos não afastam a esperança.

As leis imorais que abrem portas a negócios de património científico e tecnológico, conquistado pelo esforço de muitos e com apoio internacional, associadas a práticas de gestão duvidosa determinaram processos lentos de extinção, incoerentes como aconteceu ao LNETI, em nome de falsos reformismos, não serão suficientes para destruir “escolas de saber”, como a de Vieira de Sá.

Fernando Vieira de Sá permanece como símbolo de dedicação ao trabalho sério e honrado, de alguém que continua a sonhar com um futuro melhor para a “inteligência nacional”.

José Veiga Simão

18.8.09